quarta-feira, 31 de outubro de 2007

Hotel Hell


O pesadelo de Joca Reiners Terron nos microcontos de Hotel Hell

por Steffania Paola

Para onde, amigo?
- Pro inferno.
- Ah, te deixo no Hotel Hell, conhece?
- Cumé? Um hotel?
- É, grande como uma cidade. Tem tudo por lá, cassinos, bares, ruas, avenidas – o caralho.”

Imagine uma cidade, ou melhor, um parque temático no qual paquidermes, macacos que comem "merda” e bebês de 60 anos transitam pelas ruas como seres urbanos normais. Se depender de Joca Reiners Terron, São Paulo é mais ou menos isso. Some-se uma dose de escatologia, algum humor e muito caos.

Hotel Hell, segundo livro em prosa de Joca Terron, é uma metáfora da maior metrópole da América Latina. O texto é escrito em forma de micro-histórias. Trata-se de uma coletânea dos post’s do blog do autor. O Hotel Hell foi construído em cima de um cemitério de macacos e, segundo descreve o taxista, "lá dentro as putas é que escolhe os clientes.(...) e tem gangues de comedores de merda que seqüestra todo mundo".

Em algumas passagens a escatologia dá espaço ao lirismo. É o caso de “O Outono Sempre Queimando seus Brotos” e “As Entranhas”. Joca transforma o caos do centro de São Paulo - com seus "taxistas em chamas" - em pura poesia. Já o humor ácido de Hotel Hell está em “Tchau”, micro-história em que um suicida, enquanto estrebucha, percebe uma rachadura no teto. Deixa então um bilhete pedindo que arrumem. Depois do suicídio, ocorre uma espécie de reencarnação: é quando ele se dá conta de que é a nova Sheila ruiva do É o Tchan.

Outro destaque é o poeta que, em certa passagem do livro, corta a genitália de um homem e avisa sua esposa que ela tem 24 horas para pagar o resgate. A linguagem apurada está em “O Canto do Messias Assado”. Messias assado ou oráculo, o frango assado. Aqui Joca escreve ou descreve a linguagem do cocoricó: “cóquóquase todos aquietam e cocólocócam o cocóração de cócoras”.


Joca Reiners Terron
O caos parece atingir o ápice em “Cidades são fábricas de merda”, uma das últimas histórias. A velocidade com que se desenvolve é traduzida na linguagem rápida e confusa de Joca, “E luzes. E luzes. E luzes. E passam rápidas. E postes. (...) E ruas. E gente. Gente pra caralho.” O final ficou para as cigarras que cantam fora da época em “Sem Chance”.

O retrato fiel do inferno, ninguém sabe. Mas se Joca pretendeu descrever o inferno em meio à caótica vida moderna, com certeza chegou lá. Joca, além de escritor é editor da Ciência do Acidente. Já publicou os livros de poemas Eletroencefalodrama (1998) e Animal Anônimo (2002), os de prosa Não há Nada Lá (2001), Hotel Hell (2003) e acaba de lançar pela editora Planeta Curva de Rio Sujo.

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